Tempestades
Tempestades: A Ação dos Espíritos sobre os Fenômenos da Natureza

A Doutrina Espírita, codificada por Allan Kardec no século XIX, lançou luz sobre uma imensidão de fenômenos antes envoltos no mistério e na superstição. Entre os mais impactantes desses fenômenos estão os da natureza, cuja grandiosidade frequentemente inspira temor e reverência. Tempestades, furacões, terremotos, ventanias e enchentes sempre despertaram no coração humano a sensação de pequenez diante das forças que regem a Criação. Todavia, o Espiritismo, longe de alimentar o medo, convida ao entendimento e à reverência consciente.
Na pergunta 539 de O Livro dos Espíritos, Kardec questiona diretamente sobre a origem espiritual das tempestades e a ação dos Espíritos nesses acontecimentos. A resposta, sintética, abre um campo vasto de investigação: “Reúnem-se em massas inumeráveis.” Aparentemente simples, essa resposta encerra verdades profundas que se desdobram em uma visão espiritual da natureza. Tais revelações são magnificamente ampliadas pelo Espírito Miramez em seu comentário doutrinário contido na obra Filosofia Espírita, na qual expõe, com clareza e beleza poética, o trabalho dos Espíritos na condução dos fenômenos naturais, inserindo-os no contexto mais amplo da harmonia universal.
Este artigo tem por finalidade examinar de forma minuciosa e doutrinariamente fiel a realidade das tempestades sob o olhar espírita, baseando-se exclusivamente na pergunta 539 de O Livro dos Espíritos e no comentário de Miramez. Nosso propósito é aprofundar a compreensão do leitor acerca da espiritualidade por trás da natureza, contribuindo para a elevação da fé raciocinada e do respeito às Leis Divinas.
A Pergunta 539: Um Convite à Compreensão Espiritual da Natureza
Allan Kardec, ao organizar as perguntas que compõem O Livro dos Espíritos, o fez com método, lucidez e finalidade pedagógica. A pergunta 539 é um exemplo claro de sua preocupação em compreender não apenas os aspectos morais e éticos da vida espiritual, mas também os mecanismos da natureza sob o ponto de vista do mundo invisível:
“A produção de certos fenômenos, das tempestades, por exemplo, é obra de um só Espírito, ou muitos se reúnem, formando grandes massas, para produzi-los?”
A resposta dos Espíritos Superiores é direta e objetiva:
“Reúnem-se em massas inumeráveis.”
Essa afirmação, ainda que sucinta, permite compreender que os fenômenos naturais, longe de serem manifestações automáticas ou apenas físicas, estão inseridos em um sistema coordenado de ação espiritual coletiva. É a partir dessa ideia que se desdobra todo um entendimento novo: a natureza está viva e consciente em suas manifestações, sob a supervisão da inteligência divina e dos seus colaboradores espirituais.
O Trabalho Espiritual nas Manifestações Naturais
Segundo Miramez, espírito de grande sabedoria que se comunicou por intermédio do médium João Nunes Maia, os ventos são como o sopro de Deus, instrumentos renovadores da atmosfera terrestre. Eles não se movimentam aleatoriamente: há inteligência por trás de seus fluxos, ritmos e direções. Esse movimento não é mecânico, mas espiritualmente conduzido. Diz Miramez:
“Eles são guiados por inúmeros Espíritos, muitas falanges de Entidades sob a direção dos engenheiros siderais que conhecem todos os fenômenos e sabem guiá-los para determinados objetivos.”
Essa afirmação rompe de forma definitiva com a visão materialista da natureza. A Terra, como planeta habitado por bilhões de Espíritos encarnados e desencarnados, é campo de trabalho e aprendizado para diversas categorias de Espíritos que atuam na manutenção da harmonia física e moral do orbe.
Miramez emprega a figura dos “engenheiros siderais” para designar os Espíritos superiores que detêm vastos conhecimentos sobre as leis naturais e sabem orientar os recursos da natureza segundo os desígnios divinos. A atuação deles é assistida por legiões de Espíritos de graus diversos, muitos dos quais, como ele afirma, ainda não têm plena consciência de seu papel, assemelhando-se a serventes que obedecem aos arquitetos.
Essa analogia é poderosa: a natureza é uma construção contínua, sustentada por hierarquias espirituais que trabalham em harmonia, mesmo quando os acontecimentos parecem, aos olhos humanos, desastrosos.
As Tempestades como Instrumentos de Renovação
A concepção popular muitas vezes associa as tempestades à destruição e à tragédia. Essa visão parcial e emocional impede que se perceba o valor regenerador e equilibrador desses fenômenos. Miramez ensina com clareza:
“As tempestades são forças renovadoras que limpam a atmosfera, para que a vida se esplenda com mais segurança, e os Espíritos encarregados disto sabem dosar seus valores, de modo a servir a humanidade.”
Neste trecho, ele coloca as tempestades como parte de um processo de higienização planetária. A atmosfera terrestre é constantemente reciclada para manter as condições vitais em equilíbrio. São nesses momentos de intensa movimentação que se dispersam cargas elétricas, se redistribuem massas de ar, se umedecem solos ressecados e se purificam regiões sobrecarregadas.
Na lógica espiritual da criação, o que parece destrutivo é, muitas vezes, profundamente restaurador. O sofrimento decorrente de eventos climáticos não é aleatório nem punitivo, mas parte de uma programação maior, que contempla inclusive os aprendizados cármicos dos Espíritos envolvidos.
Provas, Expiações e Coletividades
Outro ponto de grande relevância doutrinária apresentado por Miramez é o da ligação entre os fenômenos naturais e o carma coletivo. Ele afirma:
“As provas não são da Terra e, sim, das criaturas que ali se encontram.”
Essa frase precisa ser compreendida com cuidado e profundidade. A Terra, como morada temporária de Espíritos em diversas fases evolutivas, é palco de provas e expiações necessárias ao progresso individual e coletivo. Os Espíritos que reencarnam em determinadas regiões não o fazem por acaso; há uma lógica espiritual que os atrai ao meio adequado às experiências que precisam vivenciar.
Por isso, os fenômenos naturais — inclusive a escassez de chuvas, como no nordeste brasileiro — são compreendidos, dentro da ótica espírita, como reflexos da condição moral e espiritual daqueles que habitam a região. Miramez complementa:
“Se a população daquela região se mudasse toda para o sul, ali passaria a não receber chuvas, mudando o clima imediatamente.”
Esse raciocínio indica que é o conjunto espiritual que molda o ambiente físico, e não o contrário. Quando o conjunto da população progride, suaviza-se o carma coletivo e, em resposta, a própria natureza se harmoniza.
A Interação da Prece com os Fenômenos da Natureza
Dentro dessa lógica profunda de interações entre os planos, a oração ganha um papel transformador, não apenas em benefício do indivíduo, mas também como forma de cooperação com os Espíritos que operam na natureza. Miramez diz:
“Ao veres sinais de tempestades, não temas; ora, ajudando aos Espíritos encarregados dessas operações difíceis… podes aliviar até mesmo a ação coletiva desses distúrbios pela oração e pelo bom procedimento.”
A prece sincera, sobretudo quando acompanhada por atos de bondade e disciplina moral, é força espiritual ativa. Ela atua como condutor de energias elevadas, apaziguando o ambiente, inspirando os trabalhadores espirituais e influenciando positivamente os fenômenos da natureza.
Isso nos remete à passagem do Evangelho mencionada por Miramez, quando o Cristo, ao ver a tempestade ameaçar o barco em que estava com os discípulos, a acalma com sua autoridade moral. Jesus nos ensinou que o Espírito desperto tem poder sobre a matéria, e, embora ainda estejamos em estágios iniciais, podemos cooperar de modo efetivo com as Leis Divinas.
A Educação Moral como Solução Definitiva
A transformação do ambiente físico é reflexo da transformação do Espírito. Por isso, Miramez conclui que, quando a Terra ascender mais um grau na escala dos mundos, os próprios fenômenos naturais se ajustarão a essa nova condição:
“Se a Terra já tivesse alcançado mais um grau na escala dos mundos, o serviço diminuiria para todos nós, devido à harmonia dos pensamentos de todos.”
Portanto, a chave para a pacificação das forças da natureza não está apenas em avanços tecnológicos ou previsões meteorológicas, mas sobretudo na reeducação moral da humanidade. Quanto mais os seres humanos se harmonizarem com o bem, mais suave será a manifestação da natureza.
Conclusão: As Tempestades como Oportunidade de Crescimento Espiritual
Estudar a questão 539 de O Livro dos Espíritos e as palavras de Miramez é adentrar um universo de grandeza e sabedoria que nos convida a olhar para as tempestades com outros olhos. Não mais como castigos ou acasos, mas como manifestações conscientes de uma natureza viva e conduzida pela inteligência divina e espiritual.
As tempestades são mestres silenciosos. Elas nos recordam nossa pequenez, mas também nos ensinam sobre nossa grandeza potencial como Espíritos imortais. Chamam-nos à humildade, à oração, ao respeito à natureza, à reforma íntima e à cooperação com os Espíritos superiores.
Como bem conclui Miramez, a programação é divina e não humana. E nossa melhor resposta a essa programação é o amor, a prece e a vivência sincera dos ensinamentos do Cristo, como citado:
“Dá a quem te pede, e não voltes as costas ao que deseja que lhe emprestes.” (Mateus 5:42)
A harmonia da Terra será o reflexo da harmonia de seus habitantes. Que saibamos compreender e respeitar as tempestades, não apenas as do céu, mas também as do coração, como processos divinos de renovação.