18 de julho de 2025

A Paciência

Por O Redator Espírita
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A Paciência: Virtude Redentora do Espírito Imortal

Uma análise doutrinária do item 7 do Capítulo IX de O Evangelho Segundo o Espiritismo

Entre os tesouros morais que o Espiritismo resgata da mensagem evangélica de Jesus, a paciência se destaca como virtude silenciosa e transformadora. Tão discreta quanto poderosa, a paciência é frequentemente mal compreendida pelos que ainda caminham nos primeiros degraus da evolução espiritual. Muitos a veem como sinônimo de passividade, fraqueza ou resignação sem consciência. No entanto, ao examinarmos com atenção o item 7 do capítulo IX de O Evangelho Segundo o Espiritismo, compreendemos que a paciência é uma forma sublime de caridade, que exige força moral, elevação de pensamento e profundo entendimento das leis divinas.

Este artigo tem como objetivo analisar minuciosamente essa instrução ditada por um Espírito amigo na cidade de Havre, em 1862, e comentada por Allan Kardec. A lição é simples em sua estrutura, mas grandiosa em seu conteúdo. Ao refletirmos sobre ela, reconhecemos que a paciência não apenas consola os aflitos, mas conduz os espíritos à redenção de si mesmos. Sua prática revela maturidade espiritual, confiança em Deus e aceitação consciente dos mecanismos da reencarnação, da lei de causa e efeito e do amor divino em sua mais alta expressão.

A dor como bênção

“A dor é uma bênção que Deus envia a seus eleitos…”

Logo no início do trecho, o Espírito amigo nos apresenta uma ideia que contrasta frontalmente com a visão materialista e imediatista do sofrimento: a dor como bênção. Em uma sociedade em que o prazer e o conforto são frequentemente tidos como sinônimos de felicidade, falar de dor como bênção pode parecer, à primeira vista, um contrassenso. No entanto, à luz do Espiritismo, compreendemos que essa afirmação está perfeitamente alinhada com a pedagogia divina, que visa não à satisfação efêmera dos sentidos, mas à edificação do Espírito imortal.

Ao dizer que Deus envia a dor a “seus eleitos”, o Espírito não está afirmando que Deus privilegia alguns em detrimento de outros. O termo “eleitos” deve ser entendido como aqueles que aceitaram, antes de reencarnar, missões de progresso, tarefas redentoras ou provas expiatórias de maior intensidade. São Espíritos que, por já possuírem certo grau de amadurecimento moral, podem suportar experiências mais árduas e transformá-las em conquistas espirituais.

A dor, nesse contexto, deixa de ser punição e passa a ser instrumento de purificação. Assim como o fogo refina o ouro, a dor que provém das provas da vida lapida a alma, despertando nela sentimentos nobres, empatia pelo próximo, humildade, desapego e fé.

Bendizer a Deus no sofrimento

“Não vos aflijais, pois, quando sofrerdes; antes, bendizei de Deus onipotente…”

O apelo à confiança em Deus diante da dor nos remete à atitude de Jesus perante o sofrimento. Em sua via dolorosa, o Mestre não se revolta, não se lamenta, não blasfema. Sua entrega à vontade do Pai é total. Ao nos convidar a bendizer a Deus nos momentos de sofrimento, o Espírito amigo nos ensina que a verdadeira fé se revela na adversidade.

O verbo “bendizer” significa “dizer bem”, falar com louvor, agradecer. Este é um dos maiores desafios da evolução espiritual: agradecer a Deus não apenas pelas alegrias, mas também pelas dores, reconhecendo nelas os meios ocultos de nossa libertação do passado e de fortalecimento interior.

Tal atitude não implica insensibilidade ou negação da dor, mas transformação da maneira de enfrentá-la. O espírita consciente não busca o sofrimento, mas quando ele se apresenta, encara-o com serenidade e confiança. Ele sabe que nada ocorre fora da permissão divina e que toda aflição tem início, meio e fim — e que, sobretudo, tem um propósito.

A paciência como forma de caridade

“Sede pacientes. A paciência também é uma caridade e deveis praticar a lei de caridade ensinada pelo Cristo…”

Aqui, o Espírito introduz um conceito fundamental: a paciência é uma forma de caridade. Com frequência, quando se fala em caridade, pensamos imediatamente na doação material — uma esmola, uma roupa, um alimento. Essas formas de ajuda são valiosas, mas são apenas o início. A caridade real, como ensinou Paulo em sua epístola aos Coríntios (1 Cor 13), é paciente, benigna, não se ensoberbece e tudo suporta.

Praticar a paciência é, portanto, um ato de amor ao próximo e a si mesmo. É a caridade que se manifesta no domínio das palavras, na tolerância diante das ofensas, na compreensão dos limites alheios, na perseverança diante das frustrações, na abnegação perante as provas.

O espírito que aprende a ser paciente deixa de reagir com irritação, queixa ou desespero. Ele age com consciência e equilíbrio, tornando-se agente de paz nos círculos em que atua. Isso exige constante vigilância e esforço, pois vivemos num mundo onde imperam a ansiedade, a competição e a agressividade. Ser paciente é ir contra a corrente do mundo e caminhar ao lado de Jesus.

A mais penosa das caridades: perdoar os instrumentos do nosso sofrer

“Outra há, porém, muito mais penosa e, conseguintemente, muito mais meritória: a de perdoarmos aos que Deus colocou em nosso caminho para serem instrumentos do nosso sofrer…”

Este trecho nos convida a uma reflexão profunda sobre o papel das pessoas difíceis em nossas vidas. Frequentemente, encaramos essas criaturas como obstáculos à nossa felicidade. No entanto, segundo a visão espiritual revelada pelo Espiritismo, elas são colocadas em nosso caminho com objetivos elevados.

Cada ofensa, cada ingratidão, cada injustiça — quando não provocada por nós mesmos — é uma oportunidade de exercício do perdão e da paciência. Não se trata de masoquismo moral, mas de desenvolvimento de virtudes que só se consolidam na vivência prática.

Perdoar os que nos fazem sofrer é um dos atos mais elevados que podemos praticar. Ele exige desapego do orgulho, empatia, confiança na justiça divina e desejo sincero de reconciliação. Quando conseguimos perdoar, libertamos não apenas o outro, mas a nós mesmos das amarras do ressentimento e do ódio.

A paciência, nesse contexto, não é passividade diante do mal, mas força moral que impede a vingança e acalma as reações impulsivas, abrindo espaço para a caridade verdadeira.

Os pequenos sofrimentos da vida: as picadas de alfinetes

“A vida é difícil, bem o sei. Compõe-se de mil nadas, que são outras tantas picadas de alfinetes, mas que acabam por ferir…”

Com linguagem singela e poética, o Espírito amigo aborda um aspecto muito presente na vida cotidiana: os pequenos sofrimentos. Muitas vezes, não são grandes tragédias que nos afligem, mas a soma de irritações, frustrações, contrariedades e desafios diários — as “picadas de alfinetes”.

Essas pequenas provas são testes constantes da nossa paciência. São as filas demoradas, os engarrafamentos, os mal-entendidos, os atrasos, os comentários ácidos, os erros repetidos dos outros, os compromissos inesperados, as doenças recorrentes… Cada um desses acontecimentos parece insignificante, mas juntos podem gerar impaciência, irritação e desequilíbrio.

Aprender a lidar com essas situações com leveza, resignação e serenidade é um exercício contínuo. O espírita, ao entender a função educativa da vida, busca não amplificar os problemas, mas solucioná-los com sabedoria e fé.

Comparação entre as dores e as bênçãos

“Se, porém, atentarmos nos deveres que nos são impostos, nas consolações e compensações que, por outro lado, recebemos, havemos de reconhecer que são as bênçãos muito mais numerosas do que as dores.”

Nesta passagem, somos convidados a mudar nosso foco. Em vez de fixarmos a atenção exclusivamente nas dificuldades, devemos observar também as bênçãos que nos envolvem. Muitas vezes, a ingratidão espiritual nos impede de perceber quantos auxílios recebemos diariamente — tanto do plano físico quanto do espiritual.

É preciso desenvolver o hábito da gratidão. Temos vida, consciência, oportunidades de recomeço, amizades, recursos, inteligência, assistência espiritual, instruções elevadas. As dores existem, sim, mas as bênçãos são muito mais numerosas e, frequentemente, passam despercebidas pela nossa cegueira espiritual.

A paciência também se nutre dessa gratidão. Quanto mais conscientes das graças que recebemos, mais forças temos para suportar os desafios.

Olhar para o alto

“O fardo parece menos pesado, quando se olha para o alto, do que quando se curva para a terra a fronte.”

Este pensamento é uma metáfora profunda sobre a atitude mental e espiritual diante das dificuldades. Quando olhamos para o alto — isto é, quando elevamos nosso pensamento a Deus, à espiritualidade superior, às finalidades eternas da vida — o peso da dor diminui. Ganhamos perspectiva. Percebemos que tudo passa, que nada é permanente, que estamos numa escola de almas.

Por outro lado, quando “curvamos para a terra a fronte”, isto é, quando nos fixamos apenas nos aspectos materiais, imediatistas e egoístas da existência, a dor se torna insuportável. A fé espírita nos ensina a olhar para o alto, a confiar, a resignar-se com entendimento, a esperar com paciência ativa e construtiva.

O modelo supremo: Jesus

“Tendes no Cristo o vosso modelo. Mais sofreu ele do que qualquer de vós…”

Todo o ensino espírita tem no Cristo o seu paradigma máximo. Ao nos apresentar Jesus como exemplo de paciência, o Espírito amigo nos recorda que o Mestre foi caluniado, traído, abandonado, injustamente condenado, humilhado e crucificado — e ainda assim, permaneceu em paz, perdoando, amando, ensinando.

Jesus é o modelo do espírito perfeito. Ele nos mostra, com sua vida, que é possível suportar a dor sem amargura, reagir ao ódio com amor, retribuir a ofensa com o bem. Ele é o maior exemplo de paciência em ação — uma paciência que não se acomoda, mas transforma. Uma paciência que não espera de braços cruzados, mas semeia o bem em silêncio.

A necessidade de expiação e fortalecimento

“Vós tendes de expiar o vosso passado e de vos fortalecer para o futuro.”

Este trecho resume o programa evolutivo da reencarnação. A vida atual não é fruto do acaso, mas consequência da lei de causa e efeito. A paciência é, portanto, também a aceitação consciente das próprias dívidas perante a vida. Quando sofremos, expiamos erros do passado e, ao mesmo tempo, nos fortalecemos para enfrentar desafios futuros com mais equilíbrio.

O Espírito que compreende isso não se revolta, mas trabalha, ora, serve e confia. Ele entende que cada prova tem sua razão de ser e que cada experiência, por mais dolorosa, pode se converter em luz.

A síntese: sede cristãos

“Sede, pois, pacientes, sede cristãos. Essa palavra resume tudo.”

O Espírito conclui sua mensagem com um convite claro e direto: ser cristão é ser paciente. Não há cristianismo autêntico sem paciência. Não há caridade sem tolerância. Não há evolução sem aceitação das provas.

Ser cristão é, acima de tudo, seguir o Cristo. E seguir o Cristo é amar, servir, perdoar e esperar — com paciência, fé e coragem.

Hino à paciência

A mensagem do Espírito amigo, no item 7 do Capítulo IX de O Evangelho Segundo o Espiritismo, é um verdadeiro hino à paciência, essa virtude silenciosa que nos aproxima do Cristo e nos fortalece na senda da evolução. Ela nos mostra que a dor é mestra, que a caridade tem muitas faces, que o perdão é libertador e que a vida, mesmo com seus desafios, é uma bênção.

Que possamos, à luz desses ensinamentos, cultivar a paciência em nossos corações. Que saibamos olhar para o alto, reconhecer as bênçãos, perdoar os instrumentos do nosso sofrimento e seguir, com coragem, o exemplo do Cristo.